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Mostrando postagens de maio, 2009

[138] Sonhos, Percepção e Alucinação, uma diferença intrínseca ou extrínseca?

Sonhos são diferentes de percepções que são diferentes de alucinações. A diferença talvez não esteja, muito embora possa estar, na qualidade das experiências que se tem ao sonhar, perceber ou alucinar. Sonhar, perceber e alucinar são estados diferentes nos quais o sujeito pode se encontrar. O sonho é um estado de repouso, os sentidos estão adormecidos e, no entanto, o sujeito passa por algum tipo de experiência fenomênica. O perceber, ver ou sentir é um estado de alerta, os sentidos captam informações do próprio corpo e do ambiente circundante que são apresentadas através da experiência perceptiva do indivíduo. A alucinação é um estado de desajuste neurológico/psíquico do indivíduo: ele tem a impressão de ver coisas que, na verdade, não existem absolutamente nas suas imediações. Na terceira pessoa, examinando o indivíduo A, estes três estados de experiência são claramente distintos e facilmente distinguíveis. Diferenças na atividade cerebral podem nos fornecer critérios não-duvidosos s

[137] Sentir dor e atenção

Em virtude desta discussão com o Alexandre Machado , mudei algumas das minhas concepções sobre a relação da sensação de dor com a faculdade da atenção. A dor tem obviamente um conteúdo fenomênico que não lhe pode ser dissociado. Mesmo que identifiquemos no cérebro quais estruturas são responsáveis causalmente pela sensação da dor, não estabelecemos com isto uma redução. Isto é, sentir dor não significa que tais e tais estruturas cerebrais estão ativas. Que tenhamos dor quando estamos atentos à dor não há dúvida. Contudo, não é claro o que dizer sobre os casos em que desviamos a atenção da dor para uma outra atividade mental custosa qualquer, por exemplo, desarmar uma bomba. Diremos, neste caso, que o indivíduo ainda tem dor? Se sim, como ainda fazer justiça à intuição de que dor e sensação de dor estão intrinsecamente entrelaçados? Qual o papel da atenção, neste caso? Ela é constitutiva da dor? A situação não parece ser análoga ao episódio em que o indivíduo volta a sua atenção para um

[136] Discussão e paridade interpretativa

Numa discussão, João acusa Marcos de criticar o filósofo Heigschelt sem compreendê-lo adequadamente. Segundo João, Marcos deveria ter feito um esforço interpretativo maior antes de se aventurar a criticar o renomado Heigschelt. Suponhamos que Marcos tenha dito que a proposição P afirmada por Heigschelt não tem como se sustentar. João, ao interpretar Marcos, atribui-lhe a afirmação de que a proposição Q afirmada por Heigschelt não tem como se sustentar e reprova Marcos dizendo que Heigschelt nunca afirmou Q. Sim, de fato, Heigschelt nunca afimou Q, mas Marcos também nunca disse que Heigschelt afirmou Q, mas sim P. Por mais surreal que essa situação fictícia soe, ela não é tão rara em nossa comunidade filosófica. A paridade interpretativa, infelizmente, não é um valor universalmente compartilhado. Exige-se que realizemos o maior esforço interpretativo possível antes de dizer qualquer coisa sobre um filósofo renomado, mas as mesmas pessoas que fazem esta exigência não estão dispostas a de

[135] Filósofo, filosofia e filosófico

Machado levanta a questão sobre as condições para se ser um filósofo. Negativamente, parece não haver dúvida de que a posse de sabedoria ou de genialidade não são condições necessárias, e nem mesmo suficientes para ser um filósofo. Um físico genial não é também filósofo por conta da sua genialidade. Sendo um termo de profissão, há um certo uso de "filósofo" que se aplica a todos os indivíduos que trabalham no ramo da filosofia. Assim como chamamos de "físicos" aqueles que trabalham com física, que pesquisam sobre física, também chamamos de "filósofos" aqueles que trabalham com filosofia, que pesquisam sobre filosofia. É como se tivéssemos definido o termo "filósofo" por "qualquer indivíduo que faz filosofia". Claro, então, que isto pressupõe que tenhamos uma clareza conceitual do que seja filosofia mais expressiva que a clareza do que seja um filósofo. Porém, poderíamos igualmente definir "filosofia" por "atividade que f

[134] Contexto, compreensão e erudição paranóica

O papel do contexto na compreensão do que alguém diz é inegável e, ao mesmo tempo, afirmá-lo é trivial. O problema é quando a categoria do contexto é usada estrategicamente como arma para imunizar o texto à crítica. Em uma passagem do Da Certeza, Wittgenstein nos convida a imaginar a seguinte situação: dois sujeitos estão discutindo e um terceiro passando por eles presencia uma elocução estranha. Um dos sujeitos, olhando para uma árvore e apontando para ela diz: "Eu sei que isto é uma árvore". O outro sujeito, vendo a perplexidade do terceiro, explica: "Nós somos filósofos". Claro, o que pode alguém querer dizer diante de uma árvore com a frase "Eu sei que isto é uma árvore"?. Sem o que podemos chamar de um contexto cético de discussão, esta frase não faz o menor sentido e arriscaríamos até a chamar a pessoa de louca. Dei um exemplo extremo, há muitos outros mais corriqueiros em que o apelo ao contexto é fundamental para responder uma questão do tipo: o qu