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Toda paixão, com efeito, por mais etérea que possa parecer, na verdade enraíza-se tão somente no instinto natural dos sexos; e nada mais é que um instinto sexual perfeitamente determinado e individualizado. (Schopenhauer)

Esta é, basicamente, a tese que Schopenhauer desenvolve no seu livro "Metafísica do Amor". O amor tem um fundamento, o instinto dirigido à perpetuação da espécie. Eu não duvido da acuidade biológica desta afirmação. É bem provável que todos os sistemas neurais que possibilitam as sensações e experiências amorosas tenham sido selecionados naturalmente. Também não duvido que o meu faro sexual seja dirigido pelo instinto. Eu só acho que o nome do livro deveria ser "A biologia do Amor". Saber qual é a causa do amor não nos ajuda em absolutamente quase nada para saber como é o amor e os significados que ele pode vir a ter para a existência humana. O que muda na minha vida enquanto vivo um amor? E depois de vivê-lo, que impressões ele deixa? Que novos horizontes se agregam à minha perspectiva? Por mais paradoxal que possa parecer, uma metafísica do amor deveria falar sobre a experiência do amor, sobre a sua vivência, sobre como ele é o meio através do qual eu sou quem eu sou e descubro quem eu sou. Sim, pois se há alguma humanidade em mim, é através da relação com os outros que eu posso conhecê-la.

Comentários

Este filosofema aborda a "quintessência" de tudo que tem Vida & Movimento & Poesia & Filosofia, mas aborda inicialmente no seu reverso. Eu sou ainda uma romântica incurável & cheia de contradições, mas confesso a você, Olga, & ao Eros, que este texto de Schopenhauer tira toda a Beleza não só da Vida como da Poesia. Imaginem!, poetas de todos os tempos se inspirando num "amor" puramente biológico e de perpetuação das espécies, é de dar calafrios, de gelar e nos mandar diretamente para O Desespero Humano de Kiekegaard. Depois, vocês têm de convir que a melhor teoria vai em segundos para o espaço quando se está apaixonado (a), muitos mudam de direção, abandonam convicções, começam a desejar coisas antes desprezadas ou tidas como indiferentes, pelo Amor Reinos sucumbem e se criam, não é verdade? Quem não tem coragem para tanto deve mesmo aderir a Schop. Você diz, Eros: "Saber qual é a causa do amor não nos ajuda em absolutamente quase nada para saber como é o amor e os significados que ele pode vir a ter para a existência humana. O que muda na minha vida enquanto vivo um amor?" e isto mostra que vais em outra direção, a não-schopenhauriana, e fico feliz pois vejo em você poesia e filosofia movidas por Vida-Verdadeira (seria um desperdício se fosses adepto da era do gelo III)
Tudo isso para dizer que teoria de amor biológico (algo bem próximo a darwin e sua evolução das espécies) não chegaria a criar meia dúzia de poemas em toda a história da humanidade (e duvido que fossem bons poemas) não seria capaz de ter embalado noites e noites e dias e dias dos grandes poetas, não estaríamos lendo as maravilhas criadas pelos poetas se a inspiração deles fosse puramente biológica, fisiológica, molecular e coisas do gênero, pois duvido que seja possível "criar"_ um verso que seja_ sem o impulso de eros (real ou imaginário) & o dono do blog,chama-se Eros. Ah, não, querido amigo, e agora?!
Apologia à Poesia: nada de teorias biológicas, tudo pela Vida-Em-Poesia-Infinita (para usar um termo que a Olga significa de forma maravilhosa!)
abraço em alma
*eu realmente não curti este texto de schop. quando o li algum tempo atrás, isso que ele viveu na época dos românticos.
Dica de belíssimas poesias embaladas pelo Amor não-puramente-biológico:
Página: Jornal de Poesia, Poeta: Soares Feitosa. Poemas: todos são lindos, mas eu adoro em especial: Abismo em três dias. O Prisioneiro, Nunca direi que te amo, Lua de março.
Olga, poderias ter uma página no Jornal de Poesia, ficaria linda com todos os Hai Kais & contos & tudo o mais que escreves.
:)
Olga, "somente agora" estás "aprendendo a escrever"? Deus do céu, o que não estarás escrevendo daqui alguns anos. Eu direi então aos amigos: "nós duas éramos amigas_em_alma no virtual quando Olga começou a escrever." :) Já nasceste com a literatura no "dentro-de-ti" (adoro essa expressão de Angelus Silesius)
Pena que Schopenhauer não possa comentar aqui no blog, aposto que ele não iria muito longe com a gente. *risos.
beijos para ti e Eros
Eros disse…
Olga,

Se uma pessoa ama outra e também está apaixonada por ela, então somente por uma razão ela poderia escolher ter filhos com um terceiro. Não me parece que seja possível que ela, nesta condição, venha a ter o desejo, no plano sensitivo e emocional, de ter filhos com um terceiro.

Se uma pessoa deseja sensitivamente ter filhos com uma pessoa, então ou ela ama essa pessoa, ou ela está apaixonada por ela, ou ambos.

O desejo emocional de ter filhos é a tentativa de realizar em matéria a união espiritual efetivada pelo amor?

Sandra,

Todo mundo fraqueja em um momento ou outro. Schopenhauer fraquejou feio ao escrever este livro. Errou o alvo infinitamente.
Olga,
nem preciso dizer que tuas palavras são sempre muito belas, teu modo de ser e perceber a Vida também, é o teu impulso para o depois, o depois que chamamos de poesia ou prosa. O Antes das palavras é precioso, não? O sentir, principalmente.
Eros,
parece que estamos todos de acordo que sem Amor não-puramente-biológico a Vida não teria nenhum tipo de arte... a arte das sensações!? Que tal uma filosofia das sensações!?
beijo em alma para os dois filósofos adoráveis.
Eros disse…
Perfeito Olga. Mas eu me referia à causa biológica. Ela realmente não diz muita coisa. Mas a causa ao mesmo tempo emotiva e sensitiva apontada por você claramente tem significado. Ver em um outro algo da nossa profunda dimensão já está no domínio do fenômeno, da vivência e não mais apenas dos fatos crus. Esta causa que você aponta é digna de uma metafísica do amor.
Eros disse…
Se o uno não é respeitado, não há duo e nem uno, para falar a verdade; há apenas desfalecimento do ser.
Acabei um texto sobre os paradoxos do amor :)
Está lá no blog das contradições, claro.
abraço em alma meus queridos amigos-filósofos
leben,
Schopenhauer teria escrito outra metafísica do amor se pudesse ele ter conhecido a ti e a tua poesia.
Olga, o que será que ele teria escrito sobre o Infinito em relação às emoções paradoxais?
humm, sinto que devemos (re)ler os poetas românticos.
Eros disse…
Mas você tem! de dormir sim.
Anônimo disse…
bom comeco

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