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Mostrando postagens de abril, 2009

[133] Quanto tempo dura uma crença?

Eu creio que há uma mesa no meio da minha sala, pois acabo de olhar para ela. Formei a crença. Por quanto tempo é razoável atribuir-me esta crença? Alguns minutos mais tarde, já na rua, cotinuo a acreditar que há uma mesa no meio da minha sala, sem estar em condições de vê-la neste instante e, ainda assim, estou justificado a ter e manter esta crença. Quais os critérios para atribuir a manutenção da crença? A resposta correta parece-me ser: depende do que se sabe sobre a constância do objeto da crença. No caso em questão, o objeto da crença é o lugar em que a mesa se encontra. Sabemos que uma mesa não muda de lugar sozinha e na ausência de qualquer razão contrária à sua permanência no lugar onde se encontra, estamos justificados a assumir que ela continua onde estava e, portanto, não emerge a necessidade de novas verificações. Na ausência desta necessidade, estamos licenciados a atribuir a permanência da crença. A situação é diferente, por exemplo,  se o objeto da crença fosse a qua

[132] Liberdade e Compulsão IV

É preciso esclarecer o conceito de compulsão . Nas postagens anteriroes (ver [129] ), tentei interpretá-lo estatisticamente, isto é, apenas por uma perspectiva da teceira pessoa, mas há elementos fundamentais da perspectiva da primeira pessoa necessários para caracterizar a compulsão. O que estava faltando é o fato de que uma vontade compulsiva (boa ou má) não é reconhecida pelo sujeito como um vontade sua. O sujeito tem a vontade, mas a vontade é percebida como algo que lhe acontece, assim como a visão de qualquer coisa é percebida como algo que nos acontece. Este caráter impositivo da vontade compulsiva, ausente nas vontades não-compulsivas, gera ansiedade no indivíduo.  Então, de duas uma, ou descrevemos o caso da pessoa santa como alguém que sempre faz o certo por ter a vontade não-compulsiva de fazer o certo, isto é, essas pessoas não têm vontades de fazer o certo que não são percebidas como suas, e, assim, elas não podem ser caracterizadas como compulsivas, ou essas vontades são

[130] Sellars e A lógica de "parece"

"X parece F a S" não é o relato de algo que se apreende imediatamente. O conteúdo de "X parece F a S" é que X é F. Se X é F, então a experiência por trás de "X parece F a S" é a experiência de ver que X é F. Se X não é F, então a experiência não é de ver. Trata-se de uma experiência enganosa. Gostaríamos de ter algo mais imediato para caracterizar esta experiência enganosa. Mas talvez não tenhamos. Ou talvez não precisemos. "O bastão semi-imerso na água parece torto". Temos aqui um parecer qualitativo, não endossamos a propriedade de ser torto do bastão. Qual o conteúdo desta experiência? Seu conteúdo é a de que o bastão é torto. Temos o mesmo tipo de experiência que teríamos se o bastão fosse torto. Na verdade, neste caso é mais adequado dizer que estamos diante de um parecer genérico. O bastão parece torto sem parecer um torto determinado, pois a presença da água no cenário impede que o bastão pareça um torto determinado, isto é, impede que o b

[129] Liberdae e compulsão III

Continuando a discussão de [127] e [125] : Por que o comportamento compulsivo é ruim? Porque ele impede que tenhamos relações interpessoais. Esta é uma descrição de um valor da nossa sociedade. Agimos e julgamos assim. Conforme a compulsão é mais ou menos intensa, ela dificultará mais ou menos o comprometimento com as relações interpessoais e, portanto, ela será considerada mais ou menos maléfica.  Se, no entanto, a vontade compulsiva é boa, isso não abrandaria o julgamento que fazemos da compulsão como ruim? Mesmo se a vontade compulsiva é boa, se o grau de compulsão é ruim, o comportamento geral do indivíduo será considerado mais maléfico que benéfico. Se uma pessoa é compulsiva por ajudar os outros, mas para saciar esta compulsão deixa de lado o cuidado de si, se esquece de se alimentar, e não ocupa o seu tempo com outras coisas que a ajuda ao próximo, dificilmente ela estará dando a atenção necessária à manutenção das suas relações interpessoais e estará até mesmo sendo irresponsá

[128] Aderência à vida

A teia de relacionamentos humanos é talvez a forma mais robusta de aderência à vida. Despreender-se da vida, das coisas da vida, exige o que Strawson chamou de 'atitude egoísta' diante dos outros. Isto é, nos relacionamos com os outros sem se comprometer com eles, a não ser na justa medida em que o comprometimento é necessário para a preservação destes outros enquanto meios para obter fins que almejamos. O relacionamento com os outros, a partir desta atitude, não desperta nenhum sentimento de responsabilidade para com eles. O convívio, assim, não pede a adesão à vida. Em contrapartida, o custo de não desejar se sentir preso à vida é elevado, demanda a mais absoluta solidão existencial. Uma vez que o relacionamento com os outros é tratado como meio e não como um fim, sensações como a de confiança, empatia, solidariedade, fundamentais para abrandar a sensação de solidão, estão bloqueadas de partida. Confiança, empatia e solidariedade exigem o comprometimento que só é possível qua