No Crepúsculo dos Ìdolos, aforismo 31, Nietzsche compara o humilde ao verme. Ele nos lembra que este se encolhe quando infligido para que assim evite um segundo safanão, esta é a sua astúcia. Depois afirma que o correlato deste comportamento na moral é a humildade. De fato, a humildade contém uma retração, uma contenção, uma castração da vontade de afirmar. O humilde fala pouco, arrisca pouco, erra pouco, apanha menos, mas também conquista menos. Mas talvez possamos aqui distinguir a humildade parcimoniosa da humildade medrosa. A primeira se baseia na prudência, o sujeito se retém por razões que ele julga sensatas. Ele se cala não para evitar a violência, mas por perceber que a probabilidade de erro é alta. É verdade que, em última instância, ele se retém para evitar o safanão, mas a violência aqui é precificada, estimada, não se trata de um medo irrefletido. Ele pondera o preço desta violência e avalia o risco de ter de vir a pagá-lo. Só então decide, enfim, é prudente. A segunda humildade, porém, se baseia exclusivamente no medo, ele é o modulador do seu comportamento, qualquer violência tem custo máximo, é um frágil, teme até um arranhão; o sujeito se cala para não apanhar mesmo que a chance de erro seja pequena, ele sequer a avalia. A humildade medrosa, essa sim, se aproxima do verme, pois o seu comportamento, como o encolhimento deste último, é o resultado de um condicionamento operante não refletido. É pelo mecanismo natural de recompensa e punição que o sujeito se condiciona irrefletidamente a este tipo de humildade, fazendo assim do mutismo um hábito sem nem mesmo saber o porquê. Mas sente-se protegido desta maneira. Eis o homem-verme, mas nem toda humildade é verminosa.
Irracionalismo é a tese de que os nossos julgamentos são arbitrários. O irracionalismo pode aplicar-se apenas a um setor do conhecimento humano. Por exemplo, podemos ser irracionalistas morais. Assim, julgamentos morais sobre como agir, o que fazer, o que é certo e errado são arbitrários, não temos uma razão para eles, eles não se fundam em nada que possa legitimá-los diante dos outros. Podem ser fomentados por nossas emoções ou desejos, mas nada disso tira a sua arbitrariedade diante da razão. Chegaríamos ao irracionalismo moral se tivéssemos razões para pensar que não há nada na razão que pudesse amparar julgamentos morais. Isto é, dado um dilema moral do tipo "devo fazer X ou ~X", não há ao que apelar racionalmente para decidir a questão. Donde se seque que, qualquer decisão que você tomar, seja a favor de X, seja de ~X, será arbitrária. Como poderia a razão ser tão indiferente à moralidade? Primeiro vejamos o que conferiria autoridade racional a um julgamento moral, pois ...
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