A vida sempre derrota a filosofia, por mais inventiva e contundente que esta última seja. O filósofo gera razões para dúvidas (Hume), cria gênios malignos (Descartes), mas o corpo crédulo do filósofo resiste crendo. O filósofo cria éticas negativas (Cabrera), desnuda o desvalor da vida, pinta em tons cinzas a nossa miséria (Schopenhauer), o absurdo de existir (Camus), mas o corpo deste mesmo filósofo apossa-se dele e reluta em viver. Na verdade, é o corpo que sempre derrota a filosofia, que invade truculento e irracional a arena da argumentação. Ainda mais fatal é o fato de ser sempre dele a palavra final. O que nos levanta a dúvida quanto à eficácia da filosofia. Pontualmente, ela pode ter alguma, tornando uns e outros vegetarianos, etílicos moderados etc. No entanto, somente o faz porque o corpo da à razão/filosofia uma pequena liberdade de manobra em alguns de seus meandros. Em outras regiões, a balbúrdia filosófica é simplesmente inaudita ao corpo. Algumas coisas a gente, o eu racional, o eu filosófico, decide, outras não e quem decide aquilo que a gente pode ou não decidir é o corpo. Por que, então, exercitar a filosofia se ela faz tão pouco? Tenho mesmo de ter alguma razão para exercitá-la? O corpo tem sede de curiosidade, alguns mais que outros. Estes últimos não têm como se furtar ao filosofar. São corpos paradoxais, é verdade, mas nem por isso menos corpos.
A distinção entre contexto de descoberta e contexto de justificação é normalmente apresentada como marcando a diferença entre, por um lado, os processos de pensamento, teste e experimentação que de fato ocorreram em um laboratório ou em um ambiente de pesquisa e que levaram ou contribuíram para alguma descoberta científica e, de outro, os processos de justificação e validação dessa descoberta. Haveria, portanto, uma clara diferença entre descrever como cientistas chegaram a fazer certas alegações científicas, o que seria uma tarefa para as ciências empíricas, como a sociologia, a psicologia e a antropologia da ciência, e justificar essas alegações, o que seria uma tarefa para a epistemologia, uma disciplina normativa e não-empírica. Essa distinção é corriqueira em debates acerca do escopo da filosofia da ciência e teria sido explicitada inicialmente por Reichenbach. Contudo, quando examinamos a maneira como ele circunscreveu as tarefas da epistemologia, notamos que alguns elemento...
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