Como ensinamos o faz de conta para um pessoa? Ensinamos o faz de conta
mostrando para a pessoa que ela não deve atribuir os predicados "é
verdadeiro" e "é falso" àquilo que ela diz. Isso que ela diz sem
interpretá-lo como verdadeiro ou falso é o que constitui o discurso faz
de conta. De qualquer modo, o discurso faz de conta é parasita do
discurso assertivo. Não há como ensinar o faz de conta antes de ensinar
como asseverar, como dizer a verdade ou a falsidade. O uso primário da
linguagem é apofântico, assertivo.
De maneira semelhante, a alucinação é parasitária da percepção. A
percepção só ocorre quando há, de fato, o objeto da percepção. Um
sujeito vê uma estante se há diante dele uma estante e a sua visão está
funcionando adequadamente, de outro modo, ele estaria alucinando ou
tendo uma ilusão. Quando o sujeito tem a alucinação de uma estante, ele
não tem diante de si uma estante. Ele tem a experiência de ver uma
estante. Esse é o máximo que podemos ir ao descrever a experiência
alucinatória: podemos dizer que o sujeito tem a experiência de x, onde x
é aquilo que, ao ver, o sujeito teria esta experiência. Mas o sujeito
não vê x quando alucina x, pois não há qualquer x para ele ver nas
imediações.
Não há como perguntar o que o sujeito vê, no caso da alucinação, como
tendo comprometimento existencial? A questão é se é necessário. Dado o
que entendemos da experiência perceptiva e da alucinação, precisamos
fazer a pergunta neste sentido? Parece que não.
O critério para dizer que eu vejo x é que eu tenha a experiência de x,
mas o critério para dizer que S vê x é que, além de ter a experiência de
ver x, x esteja de fato diante de S. O critério para dizer que eu
alucino x é que eu tenha a experiência de x, mas não há nenhum x diante
de mim. E novamente o critério para dizer que S alucina x é que ele tem
a experiência x, mas não há um objeto x diante de S. Tudo isto entendido
em condições normais de observação, isto é, olhos abertos, iluminação
razoável, o sujeito não é cego etc. Repare que não há como estabelecer
que alguém está alucinando a não ser que tenhamos uma percepção verídica
da situação em que este alguém se encontra e possamos verificar que ela
não tem x diante de si. Uma pessoa não tem como saber se ela está
alucinando em virtude da sua própria experiência: ou ela tem uma razão
ulterior para pensar que pode estar alucinando, i.e., tomou LSD, ou ela
se baseia no testemunho de terceiros, perguntando se há, de fato, x
adiante ou se ela está apenas tendo a experiência de x.
Não temos como caracterizar o conteúdo da experiência de x, no caso de
uma alucinação, a não ser nos remetendo à experiência perceptiva de x.
Por redução ao absurdo: vamos supor que, ao alucinar y, o sujeito tem y
diante de si. y agora é um objeto não-físico. De maneira semelhante, ao
perceber y, o sujeito tem y diante de si. Em ambos os casos, o sujeito
também tem a experiência de y. Ora, não há qualquer diferença entre
alucinar y e perceber y. Qualquer estado de coisas que me faça pensar
que estou a perceber y também me faz pensar que estou a alucinar
y. Sendo assim, alucinar e perceber indicam o mesmo ato consciente. Se
não há qualquer distinção entre alucinar e perceber, como casos de
alucinação puderam nos motivar a pensar que y não é um objeto físico?
Casos de percepção também deveria nos motivar a pensar a mesma
coisa. Mas, se é assim, a que se está a referir por "objeto físico"?
Parece que y não está sendo contrastado a nada.
O ceticismo que se pode levantar, portanto, não é de primeira ordem, mas
de segunda, e na primeira pessoa. Como o critério para dizer que eu vejo
que x depende apenas da experiência de ver x, sem me basear no testemunho
alheio, eu não tenho como distinguir o meu ver x do meu alucinar x. Se o
cético conseguir barrar as minhas razões extras, tirar a legitimidade do
testemunho de terceiros, talvez então se consiga levantar o ceticismo
geral quando a não saber se estou a alucinar ou a perceber. Mas perceber
e alucinar, ainda assim são distintos. Mesmo que eu não saiba se estou a
perceber, se estou a perceber x, x está diante de mim. Mesmo que eu não
sabia se estou a alucinar, se estou a alucinar x, x não está diante de
mim.
mostrando para a pessoa que ela não deve atribuir os predicados "é
verdadeiro" e "é falso" àquilo que ela diz. Isso que ela diz sem
interpretá-lo como verdadeiro ou falso é o que constitui o discurso faz
de conta. De qualquer modo, o discurso faz de conta é parasita do
discurso assertivo. Não há como ensinar o faz de conta antes de ensinar
como asseverar, como dizer a verdade ou a falsidade. O uso primário da
linguagem é apofântico, assertivo.
De maneira semelhante, a alucinação é parasitária da percepção. A
percepção só ocorre quando há, de fato, o objeto da percepção. Um
sujeito vê uma estante se há diante dele uma estante e a sua visão está
funcionando adequadamente, de outro modo, ele estaria alucinando ou
tendo uma ilusão. Quando o sujeito tem a alucinação de uma estante, ele
não tem diante de si uma estante. Ele tem a experiência de ver uma
estante. Esse é o máximo que podemos ir ao descrever a experiência
alucinatória: podemos dizer que o sujeito tem a experiência de x, onde x
é aquilo que, ao ver, o sujeito teria esta experiência. Mas o sujeito
não vê x quando alucina x, pois não há qualquer x para ele ver nas
imediações.
Não há como perguntar o que o sujeito vê, no caso da alucinação, como
tendo comprometimento existencial? A questão é se é necessário. Dado o
que entendemos da experiência perceptiva e da alucinação, precisamos
fazer a pergunta neste sentido? Parece que não.
O critério para dizer que eu vejo x é que eu tenha a experiência de x,
mas o critério para dizer que S vê x é que, além de ter a experiência de
ver x, x esteja de fato diante de S. O critério para dizer que eu
alucino x é que eu tenha a experiência de x, mas não há nenhum x diante
de mim. E novamente o critério para dizer que S alucina x é que ele tem
a experiência x, mas não há um objeto x diante de S. Tudo isto entendido
em condições normais de observação, isto é, olhos abertos, iluminação
razoável, o sujeito não é cego etc. Repare que não há como estabelecer
que alguém está alucinando a não ser que tenhamos uma percepção verídica
da situação em que este alguém se encontra e possamos verificar que ela
não tem x diante de si. Uma pessoa não tem como saber se ela está
alucinando em virtude da sua própria experiência: ou ela tem uma razão
ulterior para pensar que pode estar alucinando, i.e., tomou LSD, ou ela
se baseia no testemunho de terceiros, perguntando se há, de fato, x
adiante ou se ela está apenas tendo a experiência de x.
Não temos como caracterizar o conteúdo da experiência de x, no caso de
uma alucinação, a não ser nos remetendo à experiência perceptiva de x.
Por redução ao absurdo: vamos supor que, ao alucinar y, o sujeito tem y
diante de si. y agora é um objeto não-físico. De maneira semelhante, ao
perceber y, o sujeito tem y diante de si. Em ambos os casos, o sujeito
também tem a experiência de y. Ora, não há qualquer diferença entre
alucinar y e perceber y. Qualquer estado de coisas que me faça pensar
que estou a perceber y também me faz pensar que estou a alucinar
y. Sendo assim, alucinar e perceber indicam o mesmo ato consciente. Se
não há qualquer distinção entre alucinar e perceber, como casos de
alucinação puderam nos motivar a pensar que y não é um objeto físico?
Casos de percepção também deveria nos motivar a pensar a mesma
coisa. Mas, se é assim, a que se está a referir por "objeto físico"?
Parece que y não está sendo contrastado a nada.
O ceticismo que se pode levantar, portanto, não é de primeira ordem, mas
de segunda, e na primeira pessoa. Como o critério para dizer que eu vejo
que x depende apenas da experiência de ver x, sem me basear no testemunho
alheio, eu não tenho como distinguir o meu ver x do meu alucinar x. Se o
cético conseguir barrar as minhas razões extras, tirar a legitimidade do
testemunho de terceiros, talvez então se consiga levantar o ceticismo
geral quando a não saber se estou a alucinar ou a perceber. Mas perceber
e alucinar, ainda assim são distintos. Mesmo que eu não saiba se estou a
perceber, se estou a perceber x, x está diante de mim. Mesmo que eu não
sabia se estou a alucinar, se estou a alucinar x, x não está diante de
mim.
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