Se eu me projeto para o meu ser além, para o meu não-ser, para a situação em que estou morto e não mais existo, não faz diferença se existi enganado pelo gênio maligno ou não. Da perspectiva do não-ser, qualquer existência que eu tive tem ser em quantidade suficiente para contrastar-se com o meu não-ser. Nenhuma novidade, já que o próprio cogito se pretende uma prova de ser. O ponto é a indiferença do não-ser para os diferentes modos de existir, o existir verídico e o existir enganado. Para o não-ser, estes modos são indistintos. O que quero dizer com isto? Que sentido há em dizer que, para o não-ser, algo é assim ou assado? O sentido é muito simples, trata-se de algo a respeito do próprio sentido de ser. O não-ser fixa o alvo, o fim, a meta, o objetivo, a partir do qual, pode-se vislumbrar luminosamente o seu existir. Pode-se mergulhar em seu ser-existir de infinitas maneiras a partir deste trampolim que é o seu não-ser. Cada mergulho terá em comum com o outro a plenitude de ser, indistintamente. Cada mergulho revelará que pouco conta para esta plenitude de ser a real aderência à realidade. Seu ser terá sido pleno em todos os momentos em que se sentiu pleno, em que, ciente do seu futuro não-ser, escolheu viver seu ser.
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