O que faz o filósofo, qual a sua especialidade? Eu diria metaforicamente que o filósofo é mestre em separar grãos de areia. Ele é capaz de tomar dois grãos em seus dedos, notar suas semelhanças e pincelar as suas diferenças, quando nem mesmo o melhor dos microscópios é capaz de dar ao homem comum essa percepção. Substitua agora os grãos pelos conceitos e terás uma imagem literal do que faz o filósofo. Ele é um fazedor de distinções, um meta-lingüístico por excelência. Para o filósofo, a linguagem é uma floresta a ser devastada. Mal sabe ele que a sua atividade é ecologicamente correta: ele devasta semeando. Quando olha para trás, uma floresta ainda mais densa emergiu onde ele pensava ter deixado apenas poeira. Assim, podemos concluir que os filósofos formam a única categoria profissional que gera, no seu próprio exercício, a demanda pela sua existência.
Voltei ao assunto da ética da crença (veja aqui a minha contribuição anterior 194 ) para escrever um texto que possivelmente será publicado como um verbete em um compêndio de epistemologia. Nesta entrada, decidi enfatizar três maneiras pelas quais a discussão sobre normas para crer se relaciona com a ética, algo que nem sempre fica claro neste debate: (1) normas morais servem de analogia para pensar normas para a crença, ainda que os domínios normativos, o epistêmico e o moral, sejam distintos; (2) razões morais são os fundamentos últimos para adotar uma norma para crer e (3) razões morais podem incidir diretamente sobre a legitimidade de uma crença, a crença (o ato de crer) não seria assim um fenômeno puramente epistêmico. O item (3) representa sem dúvida a maneira mais forte pela qual, neste debate, epistemologia e ética se entrelaçam. Sobre ele, abordei sobretudo o trabalho da Rima Basu que, a meu ver, é uma das contribuições recentes mais interessantes e inovadoras ao debate da ét...
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