Se assumo como dado aquilo que aparece diretamente à consciência, então proposições podem ser dadas. Algumas crenças são formadas sem um processo de reflexão ou inferência consciente, são automáticas, são formadas por mecanismos sub-pessoais. Pode-se dizer que a experiência traz à consciência uma determinada crença. Algumas memórias também são dadas. Elas simplesmente aparecem, embora outras possam ser evocadas por um processo que demanda concentração e atenção. Mas, ainda assim não seriam dadas, no momento em que surgem? Mas o essencial do dado não é ele simplesmente ser dado, mas ser dado com uma determinada força, é ele aparecer ao sujeito impondo o seu conteúdo. O sujeito não se sente confortável em questioná-lo. Isso elimina boa parte das memórias e a maiora das crenças. E uma experiência é sempre mais dada que qualquer crença.
Voltei ao assunto da ética da crença (veja aqui a minha contribuição anterior 194 ) para escrever um texto que possivelmente será publicado como um verbete em um compêndio de epistemologia. Nesta entrada, decidi enfatizar três maneiras pelas quais a discussão sobre normas para crer se relaciona com a ética, algo que nem sempre fica claro neste debate: (1) normas morais servem de analogia para pensar normas para a crença, ainda que os domínios normativos, o epistêmico e o moral, sejam distintos; (2) razões morais são os fundamentos últimos para adotar uma norma para crer e (3) razões morais podem incidir diretamente sobre a legitimidade de uma crença, a crença (o ato de crer) não seria assim um fenômeno puramente epistêmico. O item (3) representa sem dúvida a maneira mais forte pela qual, neste debate, epistemologia e ética se entrelaçam. Sobre ele, abordei sobretudo o trabalho da Rima Basu que, a meu ver, é uma das contribuições recentes mais interessantes e inovadoras ao debate da ét...
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