Apesar da resenha não ser completamente positiva e apontar para algumas faltas e falhas consideráveis, eu gostaria de ter a grana para comprar o livro (The Phenomenological Mind, Gallagher) resenhado por Beaver. A fenomenologia está novamente em alta, como já havia salientado em [91]; não, obviamente, como um projeto de descobertas aprioristicas como fora no passado. Agora é preciso acomodá-la ao paradigma naturalista dominante. Neste quadro, a fenomenologia tem uma função bem específica a cumprir: descrever bem a nossa experiência. Muitos estudos cognitivos e neurológicos pecam em seus resultados por partirem de descrições ruins ou equivocadas da experiência, em especial, quando a temporalidade está envolvida. A fenomenologia, assim, reaparece como um método descritivo cujo objetivo é capturar, na perspectiva da primeira pessoa, o que se passa na sua experiência e, ao mesmo tempo, fazê-lo de uma forma "rigorosa", apropriada para fins científicos. É possível? Não sei. Antes é preciso olhar que tipos e quais critérios deseja-se aplicar à descrição fenomenológica para torná-la mais "objetiva" e avaliar o que se perde em termos do vivido e do que se ganha na correção descritiva. Eu mesmo fico chocado quando leio Dostoievski e tomo ciência do quanto sou incapaz de descrever com detalhe e acuro o que se passa comigo. Vem-me a dúvida: desconheço-me mais pela minha falta descritiva ou a descrição fenomênica serve apenas para transcrever em uma codificação conceitual algo que já sei intimamente, de modo não verbal? Não descubro nada de novo quando me descrevo, deixando de lado, claro, a obviedade de que venho a notar mais detalhes de uma coisa quando redobro a atenção sobre essa coisa?
A distinção entre contexto de descoberta e contexto de justificação é normalmente apresentada como marcando a diferença entre, por um lado, os processos de pensamento, teste e experimentação que de fato ocorreram em um laboratório ou em um ambiente de pesquisa e que levaram ou contribuíram para alguma descoberta científica e, de outro, os processos de justificação e validação dessa descoberta. Haveria, portanto, uma clara diferença entre descrever como cientistas chegaram a fazer certas alegações científicas, o que seria uma tarefa para as ciências empíricas, como a sociologia, a psicologia e a antropologia da ciência, e justificar essas alegações, o que seria uma tarefa para a epistemologia, uma disciplina normativa e não-empírica. Essa distinção é corriqueira em debates acerca do escopo da filosofia da ciência e teria sido explicitada inicialmente por Reichenbach. Contudo, quando examinamos a maneira como ele circunscreveu as tarefas da epistemologia, notamos que alguns elemento...
Comentários