O texto T é original ou não? Filósofos do tipo A e do tipo B acreditam que a pergunta pode ser respondida por uma questão de fato. Quando entram em desacordo, isto é, quando o texto T é dito sem originalidade pelos filósofos do tipo A, os filósofos do tipo B se defendem argumentando que os filósofos do tipo A estão contaminados por pré-juízos e preconceitos, isto é, um certo véu dos preconceitos impede que eles vejam a originalidade que, de fato, existe no texto T. Ambos parecem então, pressupor que i) a originalidade é uma propriedade objetiva do texto, ainda que ela possa comportar graus e ii) que se é possível evitar o véu dos pré-juízos, então ou apreendemos diretamente a originalidade do texto, ou a inferimos a partir de juízos confiáveis e verdadeiros sobre propriedade que conhecemos do texto T. Como talvez seja mais difícil sustentar a apreensão direta da originalidade do texto, se é que tal coisa existe com este estatuto, ambos os lados acabam tendo que desenvolver um esquema geral ou teoria para acomodar a distinção entre pré-juízos e juízos, e não é difícil imaginar que logo faremos essa distinção repousar sobre a antiga distinção entre doxa e episteme, crença e conhecimento ou, ainda, entre crença não-justificada e crença justificada. A ontologização da questão nos leva a epistemologizar a abordagem da questão. Ainda neste quadro, é possível vislumbrar céticos, irracionalistas e relativistas. Os céticos negarão a possibilidade de superar o véu dos pré-juízos, estamos fadados à prisão da doxa. Irracionalistas e relativistas (deveria distingui-los, mas não o farei aqui) podem até negar i), mas apenas para acentuar o caráter subjetivo da originalidade do texto T, universalizando-o ao máximo. A originalidade está nos olhos, é um atributo mental, cultural, no auge da subjetivação, é meramente um atributo pessoal, um dado da interpretação pessoal. Irracionalistas aindam aceitam que a questão da originalidade repousa sobre a distinção entre objetivo e subjetivo, na sua versão dicotômica. Diverge dos otimistas (céticos e dogmáticos) ao sustentar que a originaildade é completamente subjetiva, enquanto os primeiros acreditam que a questão da originalidade admite uma resposta objetiva.
A superação deste quadro requer que superemos as dicotomias milenares entre doxa e episteme e entre objetivo e subjetivo. Enquanto a questão da originalidade for posta sobre o quadro formado por estas distinções, a resposta à pergunta oscilará entre dogmatismo, ceticismo e irracionalismo. Devemos nos perguntar, no entanto, se é possível mesmo superar essas dicotomias. Redescrever a disputa entre os filósofos do tipo A e os filósofos do tipo B quanto à originalidade do texto T como uma mera luta/guerra persuasiva não é ainda permanecer no polo subjetivo, radicalizando o irracionalismo? Superamos a dicotomia entre objetivo e subjetivo dizendo, como alguns pragmatistas, que a distinção, na verdade, é de grau, indo do mais subjetivo ao mais objetivo? Isso muda alguma coisa além de flexibilizar e borrar as divisórias entre dogmáticos, céticos e irracionalistas?
Disse que a ontologização da questão da originalidade nos leva a epistemologizar a sua abordagem. Mas talvez o problema não esteja nem em ontologizar a questão, nem em epistemologizá-la, mas sim na forma como o fazemos. Que tipo de realidade é a originalidade? Se entendemos que a originalidade do texto T se aproxima da novidade de uma teoria científica das ciências naturais, então, de fato, vamos cair na ontologização como descrita acima, interpretando a originalidade ou como sendo objetiva demais ou como subjetiva demais. Mas temos boas razões para pensar que a originalidade, mesmo sendo real, bem real, é uma entidade de tipo distinto das entidades captadas por teorias científicas, em especial, pelas ciências naturais. A originalidade não é um tipo natural. A questão que devemos nos colocar é: vamos comparar a originalidade de textos com o que? Com o que ela se parece mais? O tipo de novidade que a originalidade de um texto traz parece mais com a novidade trazida por uma metáfora ainda não-sedimentada. Isto nos dá uma pista para abordar a questão da originalidade do texto T, sem esgotar ou reduzir, evidentemente, a questão. Podemos iluminar a pergunta sobre a originalidade do texto T a partir das teorias filosóficas/literárias/lingüísticas sobre a metáfora que atualmente dispomos, podemos ver a originalidade do texto T como um ruído avassalador que causa o reordenamento e reajuste das nossas crenças, tal como Davidson entende a metáfora. Não havendo ruído, não há originalidade. Mas isso não esgota a questão, já que a novidade trazida pela originalidade de um texto não se reduz à novidade trazida pela metáfora, ela apenas se parece com ela e, por isso, permite uma abordagem semelhante, mas ela se parece com outros tipos de novidades, com maior ou menor grau, e, assim, admite múltiplas e talvez complementares abordagens. A questão, então, que coloco é: com quais tipos de novidade a originalidade dos textos filosóficos se parece?
A superação deste quadro requer que superemos as dicotomias milenares entre doxa e episteme e entre objetivo e subjetivo. Enquanto a questão da originalidade for posta sobre o quadro formado por estas distinções, a resposta à pergunta oscilará entre dogmatismo, ceticismo e irracionalismo. Devemos nos perguntar, no entanto, se é possível mesmo superar essas dicotomias. Redescrever a disputa entre os filósofos do tipo A e os filósofos do tipo B quanto à originalidade do texto T como uma mera luta/guerra persuasiva não é ainda permanecer no polo subjetivo, radicalizando o irracionalismo? Superamos a dicotomia entre objetivo e subjetivo dizendo, como alguns pragmatistas, que a distinção, na verdade, é de grau, indo do mais subjetivo ao mais objetivo? Isso muda alguma coisa além de flexibilizar e borrar as divisórias entre dogmáticos, céticos e irracionalistas?
Disse que a ontologização da questão da originalidade nos leva a epistemologizar a sua abordagem. Mas talvez o problema não esteja nem em ontologizar a questão, nem em epistemologizá-la, mas sim na forma como o fazemos. Que tipo de realidade é a originalidade? Se entendemos que a originalidade do texto T se aproxima da novidade de uma teoria científica das ciências naturais, então, de fato, vamos cair na ontologização como descrita acima, interpretando a originalidade ou como sendo objetiva demais ou como subjetiva demais. Mas temos boas razões para pensar que a originalidade, mesmo sendo real, bem real, é uma entidade de tipo distinto das entidades captadas por teorias científicas, em especial, pelas ciências naturais. A originalidade não é um tipo natural. A questão que devemos nos colocar é: vamos comparar a originalidade de textos com o que? Com o que ela se parece mais? O tipo de novidade que a originalidade de um texto traz parece mais com a novidade trazida por uma metáfora ainda não-sedimentada. Isto nos dá uma pista para abordar a questão da originalidade do texto T, sem esgotar ou reduzir, evidentemente, a questão. Podemos iluminar a pergunta sobre a originalidade do texto T a partir das teorias filosóficas/literárias/lingüísticas sobre a metáfora que atualmente dispomos, podemos ver a originalidade do texto T como um ruído avassalador que causa o reordenamento e reajuste das nossas crenças, tal como Davidson entende a metáfora. Não havendo ruído, não há originalidade. Mas isso não esgota a questão, já que a novidade trazida pela originalidade de um texto não se reduz à novidade trazida pela metáfora, ela apenas se parece com ela e, por isso, permite uma abordagem semelhante, mas ela se parece com outros tipos de novidades, com maior ou menor grau, e, assim, admite múltiplas e talvez complementares abordagens. A questão, então, que coloco é: com quais tipos de novidade a originalidade dos textos filosóficos se parece?
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