Parece-me razoável que:
(1) Se S está na situação/circunstância X, S sabe que p.
(2) Se S não está situação/circunstância X, S não sabe que p.
Condicionais como estes evidenciam a sensibilidade do saber ao contexto. Vamos imaginar uma situação mais concreta. A proposição p é "se chama 'S'". A situação X é aquela em que as faculdades mentais de S estão funcionando normalmente e ele se encontra em estado de vigília. Nesta situação, não resta dúvidas de que S sabe que se chama 'S'. Vamos imaginar agora uma outra situação: S leva uma pancada na cabeça e horas depois recobre a consciência, mas tem amnésia total. Ele não sabe quem é, onde está, enfim, não se lembra de nada. Um médico chega e lhe diz que ele se chama 'S'. Ora, nesta circunstância, S não sabe que se chama 'S'. Mesmo depois do médico ter lhe dito o seu nome, S tem apenas uma razão para crer que se chama 'S', mas dada a situação de amnésia total em que se encontra, não se pode dizer, na terceira pessoa, que ele sabe que se chama 'S', nem ele diria, na primeira pessoa, que sabe tal coisa.
A investida natural do cético, afeito à tese KK (eu só sei que p se eu sei que eu sei que p, isto é, Kp -> KKp), é dizer que se S não sabe se está na situação X ou não-X, então S não sabe que p. Para ele, os condicionais deveriam ser reescritos assim:
(3) Se S sabe que está na situação/circunstância X, S sabe que p.
(4) Se S não sabe que está na situação/circunstância X, S não sabe que p.
Há uma assimetria importante entre (1)-(2) e (3)-(4). Os dois primeiros condicionais são informativos sobre o saber, sobre o que é o saber. Eles claramente evidenciam a sensibilidade do saber ao contexto. (3)-(4), porém, não informam absolutamente nada sobre o que é o saber. (3)-(4) dizem apenas que se S souber uma determinada coisa, então S sabe uma outra coisa também. Pode-se até dizer que (3)-(4) é informativo sobre saber que p, já que explicita que outra coisa S deve saber para saber que p. Mas (3)-(4) não nos dá qualquer pista para o que seja o saber em geral. (1)-(2) nos dá esta pista. O que determina se S sabe ou não alguma coisa é a situação em que S se encontra.
Mas se (3)-(4) não informa nada sobre o que é o saber, de onde o cético está extraindo a sua noção de saber aplicada na formulação de (3)-(4)? A pergunta é um pouco retórica mas ela aponta para a dificuldade central da tese KK. Ou o cético faz alguma caracterização positiva do saber, isto é, que não pressuponha o que seja o saber, ou estamos legitimados a dizer que ele não sabe, dada a situação em que ele se encontra, o que é saber. Contudo, a tese KK é aprisionadora, uma vez que a aceitamos, não temos como caracterizar o saber positivamente. Segue-se, então, que o cético não sabe, segundo o saber caracterizado em (1)-(2), o que é o saber usado em (3)-(4).
A motivação para reescrever os condicionais (1)-(2) em (3)-(4) não precisa ser necessariamente a tese KK, mas uma projeção da perspectiva da terceira pessoa sobre a primeira pessoa, o que, em todo caso, redunda em fazer uma confusão. Quando eu digo a respeito de S, que, se ele estiver na situação X, então ele sabe que p, para que *eu* saiba que S sabe que p, *eu* obviamente preciso saber se ele se encontra na situação X. Eu preciso saber se S está com as faculdades mentais em funcionamento normal e em vigília para saber se S sabe que se chama 'S'. Ou seja, para mim, o seguinte condicional seria verdadeiro:
(5) Se *eu* sei que S está na situação X, então *S* sabe que p.
A confusão ocorre quando projetamos todos estes requisitos do que se deve saber para poder atribuir a S o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S' para o que S deve saber para ter o conhecimento de que se chama 'S'. Esta projeção é uma confusão por duas razões: (a) eu tenho de saber em qual situação S se encontra pela simples razão de que eu não me encontro na mesma situação de S, eu simplesmente não sou S, estou a observá-lo. Como as nossas situações são distintas, as exigências para saber algo também são distintas e (b) as exigências para que eu possa atribuir a S o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S' não são as mesmas para que S saiba que se chama 'S', há uma diferença lógica entre eu afirmar que S sabe que se chama 'S' e S saber que se chama 'S'. E para que S saiba que se chama 'S' ele não precisa se atribuir o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S'. Quem pensa o contrário, ou está motivado pela tese KK, ou confunde as exigências de conhecimento da terceira pessoa com a primeira pessoa, ou, pior ainda, as duas coisas. Não vejo, assim, como sustentar (3)-(4).
(1) Se S está na situação/circunstância X, S sabe que p.
(2) Se S não está situação/circunstância X, S não sabe que p.
Condicionais como estes evidenciam a sensibilidade do saber ao contexto. Vamos imaginar uma situação mais concreta. A proposição p é "se chama 'S'". A situação X é aquela em que as faculdades mentais de S estão funcionando normalmente e ele se encontra em estado de vigília. Nesta situação, não resta dúvidas de que S sabe que se chama 'S'. Vamos imaginar agora uma outra situação: S leva uma pancada na cabeça e horas depois recobre a consciência, mas tem amnésia total. Ele não sabe quem é, onde está, enfim, não se lembra de nada. Um médico chega e lhe diz que ele se chama 'S'. Ora, nesta circunstância, S não sabe que se chama 'S'. Mesmo depois do médico ter lhe dito o seu nome, S tem apenas uma razão para crer que se chama 'S', mas dada a situação de amnésia total em que se encontra, não se pode dizer, na terceira pessoa, que ele sabe que se chama 'S', nem ele diria, na primeira pessoa, que sabe tal coisa.
A investida natural do cético, afeito à tese KK (eu só sei que p se eu sei que eu sei que p, isto é, Kp -> KKp), é dizer que se S não sabe se está na situação X ou não-X, então S não sabe que p. Para ele, os condicionais deveriam ser reescritos assim:
(3) Se S sabe que está na situação/circunstância X, S sabe que p.
(4) Se S não sabe que está na situação/circunstância X, S não sabe que p.
Há uma assimetria importante entre (1)-(2) e (3)-(4). Os dois primeiros condicionais são informativos sobre o saber, sobre o que é o saber. Eles claramente evidenciam a sensibilidade do saber ao contexto. (3)-(4), porém, não informam absolutamente nada sobre o que é o saber. (3)-(4) dizem apenas que se S souber uma determinada coisa, então S sabe uma outra coisa também. Pode-se até dizer que (3)-(4) é informativo sobre saber que p, já que explicita que outra coisa S deve saber para saber que p. Mas (3)-(4) não nos dá qualquer pista para o que seja o saber em geral. (1)-(2) nos dá esta pista. O que determina se S sabe ou não alguma coisa é a situação em que S se encontra.
Mas se (3)-(4) não informa nada sobre o que é o saber, de onde o cético está extraindo a sua noção de saber aplicada na formulação de (3)-(4)? A pergunta é um pouco retórica mas ela aponta para a dificuldade central da tese KK. Ou o cético faz alguma caracterização positiva do saber, isto é, que não pressuponha o que seja o saber, ou estamos legitimados a dizer que ele não sabe, dada a situação em que ele se encontra, o que é saber. Contudo, a tese KK é aprisionadora, uma vez que a aceitamos, não temos como caracterizar o saber positivamente. Segue-se, então, que o cético não sabe, segundo o saber caracterizado em (1)-(2), o que é o saber usado em (3)-(4).
A motivação para reescrever os condicionais (1)-(2) em (3)-(4) não precisa ser necessariamente a tese KK, mas uma projeção da perspectiva da terceira pessoa sobre a primeira pessoa, o que, em todo caso, redunda em fazer uma confusão. Quando eu digo a respeito de S, que, se ele estiver na situação X, então ele sabe que p, para que *eu* saiba que S sabe que p, *eu* obviamente preciso saber se ele se encontra na situação X. Eu preciso saber se S está com as faculdades mentais em funcionamento normal e em vigília para saber se S sabe que se chama 'S'. Ou seja, para mim, o seguinte condicional seria verdadeiro:
(5) Se *eu* sei que S está na situação X, então *S* sabe que p.
A confusão ocorre quando projetamos todos estes requisitos do que se deve saber para poder atribuir a S o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S' para o que S deve saber para ter o conhecimento de que se chama 'S'. Esta projeção é uma confusão por duas razões: (a) eu tenho de saber em qual situação S se encontra pela simples razão de que eu não me encontro na mesma situação de S, eu simplesmente não sou S, estou a observá-lo. Como as nossas situações são distintas, as exigências para saber algo também são distintas e (b) as exigências para que eu possa atribuir a S o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S' não são as mesmas para que S saiba que se chama 'S', há uma diferença lógica entre eu afirmar que S sabe que se chama 'S' e S saber que se chama 'S'. E para que S saiba que se chama 'S' ele não precisa se atribuir o conhecimento de que ele sabe que se chama 'S'. Quem pensa o contrário, ou está motivado pela tese KK, ou confunde as exigências de conhecimento da terceira pessoa com a primeira pessoa, ou, pior ainda, as duas coisas. Não vejo, assim, como sustentar (3)-(4).
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