Quando
respeitamos o intelecto dos outros e o nosso próprio, discutimos as
crenças dos outros e colocamos as nossas em discussão, é simples.
Pensar que respeitar a crença do outro (ou a sua própria) implica
em jamais discuti-la parece presumir que o "intelecto" não
tem qualquer interesse pela verdade ou talvez que a verdade seja
completamente uma função das suas crenças. Ambas as alternativas
não são muito plausíveis. Evidente que não somos apenas
intelecto, nem que a verdade seja o nosso único interesse. Não
temos de ser chatos conosco ou com os outros na discussão das
crenças. A discussão cabe em alguns lugares e em alguns momentos.
Nem tem de ser gratuita; acerca de alguns tópicos, pode ser que ela
demande motivação. As crenças apenas não estão absolutamente
imunes à discussão, como se tivéssemos com elas uma mera relação
de propriedade, “são minhas e ninguém tem nada a ver com isso”.
Não é bem assim se você tem alguma vida em comum e não é bem
assim se você tem algum interesse pela verdade objetiva. Por fim, o
que talvez alguém queira razoavelmente dizer ao afirmar: “respeite
a minha opinião” é: “respeite a finitude do meu intelecto,
dê-me tempo para pensar etc”. Por várias razões, a justa
resposta à discussão não tem de ser pronta e imediata. Não tem
mesmo.
Voltei ao assunto da ética da crença (veja aqui a minha contribuição anterior 194 ) para escrever um texto que possivelmente será publicado como um verbete em um compêndio de epistemologia. Nesta entrada, decidi enfatizar três maneiras pelas quais a discussão sobre normas para crer se relaciona com a ética, algo que nem sempre fica claro neste debate: (1) normas morais servem de analogia para pensar normas para a crença, ainda que os domínios normativos, o epistêmico e o moral, sejam distintos; (2) razões morais são os fundamentos últimos para adotar uma norma para crer e (3) razões morais podem incidir diretamente sobre a legitimidade de uma crença, a crença (o ato de crer) não seria assim um fenômeno puramente epistêmico. O item (3) representa sem dúvida a maneira mais forte pela qual, neste debate, epistemologia e ética se entrelaçam. Sobre ele, abordei sobretudo o trabalho da Rima Basu que, a meu ver, é uma das contribuições recentes mais interessantes e inovadoras ao debate da ét...
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