Bernard Williams, diante do indivíduo que adota a postura amoral em virtude da falta de razões para agir assim ou assado, pois não vê sentido em nenhuma delas, diz que, neste caso, a falta não é da racionalidade, mas da humanidade. A humanidade fracassa diante deste indivíduo em lhe dar ajuda e esperança. Não lhe faltam razões, o que lhe falta é ver sentido nas razões. Porém, as razões não têm como fazer o indivíduo perceber tal sentido. O tecido envolvente que poderia despertar esperança no indivíduo não é o da racionalidade, mas o das relações humanas. O amoral por falta de sentido é o indivíduo que foi alijado da humanidade ou que se alijou da humanidade. Em todo caso, soa-me como uma fraqueza da razão dizer que ela não consegue embutir o seu próprio sentido, o que obviamente não implica que o sentido lhe seja acoplado irracionalmente. Significa apenas que isoladamente ela não o produz.
E, no entanto, Williams está correto. Nenhum argumento é capaz de fazer com que uma pessoa veja sentido nas razões que lhe são apresentadas. Reconhecer sentido nas razões não é assunto de
convencimento. É preciso deixar claro o tipo de sentido em jogo. Não se trata obviamente do sentido expresso pela razão. Não é uma questão de saber o conteúdo de uma razão. Isto poderia ser elucidado por uma explicação ou paráfrase e, portanto, por um argumento. "Reconhecer ou ver sentido em uma razão" deve ser aqui entendido assim: "esta razão é, para mim, significativa, eu me importo com ela. Ao pensar nesta razão, sinto-me envolvido com ela, comprometo-me com ela. Há um certo sabor fenomênico ao contemplar esta razão, sinto-me emocionalmente direcionado em favor dela".
Não há argumento que possa produzir envolvimento e comprometimento se o indivíduo já não tem nenhum comprometimento e envolvimento. Se ele tem algum, então pode-se produzir argumentos em favor do comprometimento com coisas que se seguem daquilo com o qual o sujeito já está comprometido. Mas se nada lhe é significativo, se ele não vê sentido em nada, se ele não se sente envolvido com nada, então não há argumento que o faça se envolver. A única maneira de ele vir a se envolver com alguma coisa é através do envolvimento. Explico. Ao relacionar-se com o outro, um outro que envolva-se com ele, que se mostre comprometido com ele, que se preocupe com ele, pode-se esperar que, por estas interações genuinamente humanas, desperte-se nele o comprometimento e a preocupação com o outro. Esta já é uma situação mínima em que não se pode mais dizer que nenhuma razão lhe parece ter sentido. Não elimino por completo a possibilidade de que o indivíduo venha a desenvolver de modo egoísta o comprometimento consigo mesmo. Se isto é possível ou não, de qualquer modo está licenciada a conclusão: não há, na primeira pessoa, qualquer razão sem um mínimo de sentimento e envolvimento. Quem perde por completo a capacidade de se envolver, perde a capacidade de pensar propriamente.
E, no entanto, Williams está correto. Nenhum argumento é capaz de fazer com que uma pessoa veja sentido nas razões que lhe são apresentadas. Reconhecer sentido nas razões não é assunto de
convencimento. É preciso deixar claro o tipo de sentido em jogo. Não se trata obviamente do sentido expresso pela razão. Não é uma questão de saber o conteúdo de uma razão. Isto poderia ser elucidado por uma explicação ou paráfrase e, portanto, por um argumento. "Reconhecer ou ver sentido em uma razão" deve ser aqui entendido assim: "esta razão é, para mim, significativa, eu me importo com ela. Ao pensar nesta razão, sinto-me envolvido com ela, comprometo-me com ela. Há um certo sabor fenomênico ao contemplar esta razão, sinto-me emocionalmente direcionado em favor dela".
Não há argumento que possa produzir envolvimento e comprometimento se o indivíduo já não tem nenhum comprometimento e envolvimento. Se ele tem algum, então pode-se produzir argumentos em favor do comprometimento com coisas que se seguem daquilo com o qual o sujeito já está comprometido. Mas se nada lhe é significativo, se ele não vê sentido em nada, se ele não se sente envolvido com nada, então não há argumento que o faça se envolver. A única maneira de ele vir a se envolver com alguma coisa é através do envolvimento. Explico. Ao relacionar-se com o outro, um outro que envolva-se com ele, que se mostre comprometido com ele, que se preocupe com ele, pode-se esperar que, por estas interações genuinamente humanas, desperte-se nele o comprometimento e a preocupação com o outro. Esta já é uma situação mínima em que não se pode mais dizer que nenhuma razão lhe parece ter sentido. Não elimino por completo a possibilidade de que o indivíduo venha a desenvolver de modo egoísta o comprometimento consigo mesmo. Se isto é possível ou não, de qualquer modo está licenciada a conclusão: não há, na primeira pessoa, qualquer razão sem um mínimo de sentimento e envolvimento. Quem perde por completo a capacidade de se envolver, perde a capacidade de pensar propriamente.
Comentários
Mais uma vez espero por sua resposta, e peço desculpas se me estendi no comentário. Seus bons textos impulsionam meus pensamentos.
Se os nazistas se importavam uns com os outros, se eles se comprometiam com o bem-estar uns dos outros, então o que lhes faltava não era o envolvimento ou mesmo a simpatia, mas talvez um exercício pontual e mais atento da simpatia que lhes fizesse perceber a ilusão da diferença na qual se apoiavam: raça ariana vs. raça judaica. Esta é uma falsa distinção, que, no entanto, tinha raízes culturais e políticas. De qualquer modo, argumentos são suficientes para demovê-las, eu acho. Faltou ali mais razão que aquela condição básica da humanidade: o envolvimento ou a simpatia. Talvez sim um exercício mais largo e abrangente da simpatia/empatia. Eu posso ser extremamente hábil em me colocar no lugar dos meus parentes, mas não no lugar de pessoas que desconheço, o que não significa que eu seja incapaz de me envolver e de me comprometer com algo ou com alguém. O ponto fundamental aqui é quão abrangente vai ser o seu envolvimento/comprometimento. E este quão abrangente parece-me questão de convencimento racional.
Em primeiro lugar, excelente postagem!
Eu acho que se pode conectar o que está dizendo -- ou pelo menos, eu pensei em relação a isso -- com as críticas de Williams a ideia de uma moralidade inteiramente impessoal, imparcial e inteiramente alijada dos sentimentos. Como sabes, a ideia de uma moralidade impessoal e imparcial, para Williams, está ligada a uma outra: a de alienação moral. É como se as demandas da moralidade fossem tais que se elas exigessem que abandonássemos aqueles projetos que nos são mais caros (alguns dos quais em estreita relação com aquelas pessoas que nos são mais caras), então nenhum outro curso de ação seria moralmente permitido. Para usar tuas palavras, é como se nos fosse exigido que abandonássemos por completo nossa capacidade de se envolver. Em outras palavras, o sujeito amoral e o sujeito que pretende estar seguindo uma moralidade estritamente imparcial e impessoal talvez não estejam em pontos tão extremos um do outro-- talvez a diferença entre eles consistindo em que o que para um é carência, para o outro é saturação.
Um grande abraço.
Excelentes observações, não tinha pensado nisso. Tenho a impressão de que os apontamentos de Strawson sobre as relações interpessoais também vão nesta direção; não há como a moral ser impessoal a não ser destruindo o que entendemos por humanidade, relações e envolvimento. Mas, neste caso, de onde a moral impessoal extrairia a sua força? Estaríamos sim muito mais inclinados a generalizar a atitude objetiva, o que, no meu entender, é deixar de pensar propriamente.
Forte abraço,
Eros.